Os homens choram pelos homens que se perderam no mar, mas
não choram os peixes que matam.
Os homens choram os homens que matam e que morrem, mas não
choram os animais que sofrem e morrem às mãos dos homens.
Os homens choram os filhos e os pais que morrem, mas não
choram os filhos dos homens a quem matam.
Os peixes, os pássaros, os insectos, todos os homens sentem,
choram, sofrem como eu, como tu, como qualquer eu ou qualquer nós. Porquê,
então, há homens que só sentem a sua própria dor? Porque é que não conseguem
sentir a dor dos outros seres, a ponto de ignorarem se têm fome, frio, sede e
mesmo, tão mesmo, a ponto de os matarem?
Que ignóbil falta de inteligência esta no animal cuja
pretensa principal característica distintiva é ser racional! Falta de
inteligência que o leva (nos leva) a ter o contrário daquela que é a sua
aspiração básica: ser feliz.
Que emoções nos traz a raiva? O desprezo? A altivez? O ódio?
Sim, eu sei que um arroz de marisco é uma refeição muito
saborosa e que traz grande satisfação; o mesmo com um leitão da Bairrada, um
entrecosto de porco preto. Satisfação que acaba mal a refeição pára. E depois
há que repetir e de novo e de novo. Satisfação tão efémera. Não será melhor ser
feliz 24 horas por dia ou as 16 em que estamos acordados?
E se em vez do filho do porco ou dos filhos dos camarões nos
viessem buscar os nossos filhos para comer? Assim como se vão buscar para a
guerra? O que sentiríamos? Como ficaríamos?
E se em vez do porco ou das amêijoas nos viessem buscar a
nós? Gostaríamos? Não nos importaríamos? Não faria mal?
Sentirão os animais de forma diferente? Deverão ser
merecedores de menos respeito? (Tal como os governantes acham que não faz mal
os outros não terem casa ou comida, enquanto as suas próprias contas bancárias
engordam e os senhores do mundo acham que não faz mal matar ou deixar morrer à
fome os pretos, os árabes, os índios, os outros.)